quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Ainda sobre a "flânerie" e sua relação com Paris

Baudelaire e Benjamin (em ordem nas fotos) nos falam sobre a flanêrie, que associo sempre a uma atitude de viajar na cidade grande: 
"A multidão é o seu domínio, como o ar é do pássaro e o mar, do peixe. Ele tem uma paixão e um credo: esposar a multidão. Para o perfeito flâneur, para o observador apaixonado, é um imenso prazer fixar residência na multiplicidade, em tudo que se agita e se move, evanescente e infinito: você não está em casa, mas se sente em casa em toda parte; você vê todo mundo, está no centro de tudo, mas permanece escondido de todos - e esses são apenas alguns dos pequenos prazeres dessas mentes independentes, apaixonadas e imparciais que a linguagem mal pode definir. O observador é um príncipe disfarçado que colhe prazeres em todos os lugares [...] O diletante da vida entra na multidão como um imenso reservatório de eletricidade."
(Charles Baudelaire - trad. de Reinaldo Moraes)
Como não lembrar de O Mistério de Marie Roget, de Edgar Allan Poe? Aqui ele trata exatamente da supressão dos vestígios do indivíduo na cidade grande. Sem falar da referência, mais óbvia, a O homem na multidão, também do norte-americano. 
Agora a visão de Walter Benjamin: 
"O flâneur é criação de Paris. Espanta é que não seja de Roma. Mas talvez em Roma até mesmo os devaneios tenham de se mover por ruas bem pavimentadas demais. E não seria a cidade muito cheia de templos, praças confinadas e santuários nacionais para poder ingressar integralmente nos devaneios do passante, junto com cada pedra de calçamento, cada placa de loja, cada lance de escada, cada portal? As grandes reminiscências, os frissons históricos - isso não passa de entulho para o flâneur, que deixa tudo de bom grado para o turista. O flâneur também trocaria de bom grado todo o seu conhecimento sobre os bairros de artistas, locais de nascimento e palácios principescos pelo cheiro de uma única soleira de porta exposta às intempéries ou pelo toque de um único azulejo - coisa que qualquer cão velho carrega consigo. Muito disso deve ter a ver com o caráter do romano. Pois não são os estrangeiros, mas eles mesmos, os parisienses, que fizeram de Paris a Terra Prometida dos flâneurs, uma 'paisagem feita de gente viva', como Hofmannsthal chamou-a uma vez. Paisagem - é isso que a cidade se torna para o flâneur. Ou, mais precisamente, a cidade se divide em dois pólos dialéticos. Torna-se uma paisagem que se abre para ele e uma sala de estar que o encerra." (preferimos utilizar a referência de E. White, traduzida por Reinaldo Moraes; o ensaio completo de Benjamin, O flaneur, pode ser conferido no terceiro volume das suas Obras escolhidas, editada pela Brasiliense, que padece, entretanto, de uma inexplicável omissão no texto citado). 
Mas nem veja o leitor aí qualquer postura reducionista da minha parte. Trata-se apenas de uma atitude experimental na cidade grande. A viagem tem outras facetas, dependendo de para onde se vá, o que ainda será assunto para outras conversas. 

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